PARAQUEDISTA CONHECES A TUA HISTÓRIA? (XIII) OS POEMAS DE ANDRÉ ZIRNHELD E LUÍS TINOCO DE FARIA
As Oração e Prece de um Paraquedista, poemas adaptados a essa finalidade, são conhecidas da generalidade dos paraquedistas portugueses. Participam na criação e fortalecimento do espírito de corpo dos boinas verdes. Agora, em 2025 quando pela primeira vez é publicada, em França, uma biografia de André Zirnheld – 83 anos após a sua morte em combate – vamos abordar o percurso em Portugal destes poemas que tanto motivaram e ajudaram milhares de boinas verdes ao longo da vida, especialmente nos momentos de maior dúvida ou dificuldade.
Escrever “Oração” ou “Prece” foi opção tomada entre
nós ao longo dos anos - quase sempre - para distinguir os poemas de Tinoco de Faria e Zirnheld.
A “Prece” do francês André Zirnheld, é anterior à de
Tinoco de Faria, foi escrita em 1938. O
jovem Aspirante paraquedista dos SAS franceses, era antes da guerra filosofo e
poeta, e este foi um dos poemas que escreveu sem divulgar. Depois da descoberta
do seu caderno de poemas, quando morreu em combate em 1942, foi discretamente
divulgado este poema num jornal francês em 1942, e depois, na BBC em 1943. Só mais
tarde, depois de terminada a 2.ª Guerra Mundial, se tornou conhecida e usada
pelos paraquedistas franceses que então a adoptaram.
A de Luís António Sampaio Tinoco de Faria, segundo o
filho, Luís, também ele boina verde (105.º Curso de Paraquedismo - 1980) «…recordo-me
da minha mãe dizer que o meu pai tinha escrito a “oração de um paraquedista”
durante os meses que esteve em Alcantarilla no Curso de Espanha (Abril a Julho
de 1955)…». Ou seja, ao contrário do poema francês, esta foi uma Oração escrita
no contexto a que se destinava.
Recentemente foi encontrado num espólio pessoal do
primeiro comandante do Batalhão de Caçadores Paraquedistas, o então Capitão
Armindo Martins Videira, um documento, sem data, em língua francesa, com o “Poema
Paraquedista” de Zirnheld, aquilo que depois se designaria “Prece de um
Paraquedista”. Sabendo-se que Videira esteve em França em 1951 e 1953 na Escola
de Tropas Aerotransportadas (e mais tarde na Argélia francesa) certamente foi
numa dessas primeiras ocasiões que o trouxe, até a avaliar pelo título, ainda
não o definitivo que acabou por ter divulgação mundial. Armindo Videira, que
falava francês pode ter sido ele a traduzir o poema para português, e esteve
com Tinoco de Faria no Curso de Espanha em Alcantarilla. Terão falado sobre o
assunto? Impossível saber. Sabemos isso sim, também pelo filho, que Tinoco de Faria
era leitor de Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944), o célebre escritor,
ilustrador e piloto francês, também morto como Zirnheld no decurso da 2.ª
Guerra Mundial, mas com obra publicada desde os finais dos anos 20.
Em Tancos, no Batalhão de Caçadores Paraquedistas (BCP,
1956-1961) circulava um pequeno desdobrável, de boa qualidade, impresso na
Papelaria Fernandes, mas sem data, com a “Prece de um Pára-quedista” de André
Zirnheld. Ainda em Tancos, corria o ano de 1958, a “Oração de um paraquedista”
do Capitão Paraquedista Luís Tinoco de Faria, foi publicada no jornal do
batalhão, “Salta”, que lhe atribuiu a primeira página na sua edição de
Janeiro-Fevereiro desse ano.
São assim contemporâneas nos paraquedistas portugueses
a Prece e a Oração, não tendo sido possível até agora descortinar se Tinoco
Faria conheceria ou não o poema de Zirnheld quando escreveu o seu.
O livro da História das Tropas Paraquedistas, volume
I, relativo ao BCP (Tancos, 1997), não aborda esta questão da Oração e Prece e
as várias publicações relativas às tropas paraquedistas que conseguimos
consultar também não esclarecem.
Na realidade ao longo dos anos foram várias vezes
publicadas quer a Oração quer a Prece, mas por regra, apenas os poemas e uma ou
outra informação adicional sobre os autores.
Apresento nas imagens abaixo o que consegui ver
publicado ao longo dos anos, acredito que sobretudo nos “Catatuas” possa ter
havido mais publicações sobre o tema.
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Alcantarilla, 1955. Na imagem à esquerda o então Alferes Miliciano de Infantaria, Luís Tinoco de Faria. |
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A edição do "Salta" de 1958, boletim do BCP, pela primeira vez publica a Oração de um Paraquedista |
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O Boina Verde, ainda em Angola, Boletim do BCP 21, também publica a Oração. |
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in Revista Boina Verde |
Museu das Tropas Paraquedistas, Tancos. |
Já os acontecimentos que envolveram a morte em combate
de André Zirnheld apenas muito sucintamente foram tratados nas nossas
publicações paraquedistas – do que foi possível detectar – apenas o então
Capitão Paraquedista Vítor Gomes desenvolveu o tema no “O Templário” do 1.º
BIPara em Outubro de 2002, e, eu próprio na revista Páras de Maio de 2007,
tendo na altura baseado o meu texto na revista francesa “Troupes d’Elite”,
Volume IV, 1986. Sendo certo que nos dias de hoje “a internet” tem vária
informação, nem toda fidedigna, mas muita correcta replicada de publicações
militares francesas, na realidade apenas agora, em 2025, surge a primeira
biografia digna desse nome de André Zirnheld. Este jovem francês que morreu em
combate com 29 anos de idade, tinha cursado filosofia na Sorbonne e foi viver e
trabalhar para Túnis (protectorado francês, Tunísia). Não fosse a 2.ª Guerra
Mundial e nada faria prever que pegasse em armas e viesse a integrar os paraquedistas
franceses dos SAS ao serviço da “França Livre” do General Charles de Gaulle.
Não vamos agora detalhar, a Prece de Zirnheld ganhou
ao longo dos anos uma crescente relevância, visibilidade, não só mas sobretudo
no seio dos paraquedistas franceses, tendo inclusive o seu nome sido dado a toda a
área da Escola de Tropas Aerotransportadas (ETAP) em Pau, 65 hectares, agora designada “Camp Aspirant Zirnheld”. Tem uma Praça em Paris com o seu nome (inaugurada em
2022), uma placa na casa onde nasceu na capital francesa (descerrada em 2023) e
uma outra no Liceu onde estudou (descerrada também em 2023). Além dos páras, também
a “École militaire interarmes” (onde os sargentos do Exército francês podem ascender
a oficiais) o homenageou, dando o seu nome ao curso 1964-65.
Luís Tinoco de Faria e André Zirnheld, cada um com as suas particularidades, fazem parte da História das Tropas Paraquedistas Portuguesas.
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